quinta-feira, 25 de outubro de 2007

eu zanguei numa cisma, eu sei

Eu devo estar ficando muito velha. Muito mesmo, daquelas que comparam o período de ouro (o meu, claro) e os dias de hoje. E sempre com aquela nostalgia, acompanhada do último suspiro e da frase ‘na minha época...’ O problema é que eu nem sei se minha época era tão boa assim. Aquilo de que você vai dizer: os preços eram mais baixos, políticos menos corruptos e os mais novos respeitavam os mais velhos, pode ainda não ter acontecido. Os demais sintomas, entretanto, estão se concretizando.

“Na minha época” as meninas não se aceitavam como eram (como ainda acontece com as meninas de doze anos e com a de dezoito que vos escreve): o problema passava pelo cabelo, pelas espinhas - que todo mundo começava a ter, mas que caiam como praga em dias específicos-, por atributos físicos que ainda hoje causam embaraço e por problemas até então imperceptíveis, mas que os meninos da sala faziam questão de apontar em alto e bom tom. Pode ser que minha infância tenha sido muito sem graça, com menos gloss e mais elástico, menos prancha e mais “BJfeliz”. Só que, com certeza, havia menos preocupação e menos intrigas e menos paqueras. “Na minha época” (que agora será substituído por NME), todas as meninas eram “eternamente a fins” de dois ou três garotos mais velhos (mas não muito!). Parava por aí, parava nas cartinhas nunca entregues e nos repetidos corações com as iniciais. Já os meninos comentavam quão gostosas eram as garotas do ano seguinte, que acabavam de comprar o primeiro sutiã, mas já serviam de parâmetro.

NME, a gente ia na sacada de um certo shopping e, as vezes, numa baladinha bem fraquinha ao lado. NME, isto era o máximo. Desfilar no shopping domingo e comentar a respeito das outras aspirantes a modelo era O programa perfeito. Hoje em dia a coisa tá bem diferente. Quer dizer, pelo que eu vejo o elástico já foi abolido e a prancha é praticamente parte integrante do uniforme. Os desfiles superaram as portas do shopping e, atualmente, estão em qualquer lugar. Qualquer saidinha é motivo pra rímel e roupa escolhida a dedo. E, engana-se quem pensa que roupas da Lilica Repilica e da c&a servem. GAP, Ecko, DKNY e por aí vai. Jogo de futebol: meninas de catorze anos empurrando goela abaixo a cerveja do copo de plástico só pra acompanhar meninos carregando correntes de prata e camisas de torcida organizada, que lá fora esperam pela carona de seus pais.

A infância é coisa da minha época? Ou será coisa da minha cabeça e do ensino integral do Bom Jesus? Os tempos são outros, as novas fôrmas utilizadas pelos meios de comunicação são outros, o mundo é outro, até aí tudo bem. Nesse tempo de momentos, de bytes, de globalização acima dos resquícios culturais, já não há mais espaço para a gordinha de cabelo crespo, ou pro tímido com camiseta pra dentro da calça. NME também não era “fácil” pra ninguém, mas os comentários não eram impressos em fotologs, rodavam perfis de Orkut e acabavam sem punição. NME as mães não pagavam alisamentos, não ensinavam as filhas a esconderem olheiras nem incitavam comentários maldosos sobre a roupa de outras crianças de doze anos. Talvez os pais de épocas ainda mais remotas, daquelas meninas que eram apaixonadas pelos contemporâneos dos meus pais, é que sejam fruto desse início da onda de globalização. E hoje são mães dessas mesmas meninas que me assustam. Os filhos desses filhos, das ‘crianças’ de hoje em dia, serão que tipo de adultos, então?


@ paquetá
bongo bong
joão e maria (sempre)